quarta-feira, maio 30, 2012

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‎"Um regador, um ancinho abandonado no campo, um cão ao sol [...], cada um destes objectos, e mil outros parecidos, sobre os quais os olhos normalmente passam com natural indiferença, pode de repente, a qualquer momento, ganhar para mim um carácter sublime e comovedor que a totalidade do vocabulário me parece demasiado pobre para o poder expressar." (Hoffmannsthal, Carta de Lord Chandos)

‎"Em resumo: nesses dias, num estado de embriaguez permanente, toda a existência se me apresentava, então, como uma grande unidade: entre o mundo espiritual e o mundo material parecia não existir qualquer contraste, tão-pouco entre as maneiras corteses e as brutais, entre a arte e a barbárie, entre a solidão e a sociedade; em tudo sentia a presença da Natureza, tanto nas aberrações da loucura como nos requintes mais extremos dum cerimonial espanhol; nas boçalidades de jovens camponeses não menos que nas mais delicadas alegorias; e em todas as expressões da Natureza sentia-me a mim mesmo; quando, na cabana de caça, me dessedentava com o leite espumoso e morno que, das tetas duma bela vaca de olhos meigos, uma rapariga de cabelos desgrenhados mungia para um balde de madeira, em nada era esta experiência para mim diferente de quando, sentado no banco da janela do meu estúdio, o meu espírito absorvia o suave e espumoso alimento dum livro. [...]" (ibid.)

sexta-feira, maio 25, 2012

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"Sobretudo não acredite, leitor, que os livros que não escrevi são puro nada. Pelo contrário (que fique claro de uma vez por todas), estão como em suspensão na literatura universal."
(Marcel Bénabou, Por Que não Escrevi Nenhum dos Meus Livros)

quinta-feira, maio 24, 2012

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"Mas foi coisa de um instante porque, ao dilatar-se, aquela sensação sofria uma estranha metamorfose, como se uma luva, ao voltar-se do avesso, levasse consigo a mão que protegia. Tudo mudou de perspectiva, num ápice experimentou a embriaguez da descoberta, uma náusea subtil e mortal melancolia. Mas também um sentimento infinito de libertação, como quando percebemos finalmente qualquer coisa que sabíamos desde sempre e queríamos ignorar: não era o já visto que o engolia num passado nunca vivido, ele é que o capturava num futuro ainda por viver."
(Antonio Tabucchi, O Tempo Envelhece depressa)

1943-2012

Pessoa é "uma arca cheia de gente". (Antonio Tabucchi)

terça-feira, maio 22, 2012

Da caridadezinha...

Salvo raras excepções, os programas televisivos informativos dedicam-se à tarefa de atirar areia para os olhos do telespectador. O Prós e Contras é especialmente violento na forma como o faz: é às pazadas; se um gajo não tem cuidado chega ao fim da emissão soterrado...

Chega mesmo a ser ofensivo... Ontem, num programa supostamente dedicado aos movimentos da sociedade civil que se vão organizando para combater "o estado a que isto chegou", grande parte do tempo foi perdido a dar a conhecer as soluções que se vão encontrando para dar de comer aos pobres deste País. Será que há interesse em discutir formas de irradicar a pobreza, e de criar uma sociedade mais igualitária? Claro que não! Para quê? Vamos mas é gastar o tempo do debate (pago com o nosso dinheiro!) a trocar ideias sobre como não os deixar morrer à fome... Até porque, assim, enquanto os formos aguentando vivos (mesmo que num lugar para além da dignidade), podemos ir perpetuando esta miséria...

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"There is a pioneering study done by Glasgow University on the reporting of Palestine. They interviewed young people who watched TV news in Britain. More than 90 percent thought the illegal settlers were palestinian. The more they watched, the less they knew - Danny Schecter’s famous phrase." (John Pilger)

segunda-feira, maio 21, 2012

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"Será isto utópico? Um mapa do mundo que não inclua a Utopia não merece sequer um olhar, pois põe de parte o único país onde a humanidade desembarca a todo o momento. E quando lá chega, a humanidade perscruta o longe e, divisando um terra melhor, iça as velas e põe-se de novo a caminho. O progresso é a realização das utopias."
(Oscar Wilde, A Alma do Homem e o Socialismo)

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‎"Pela primeira vez, fiz esta triste constatação: as pessoas dizem que gostam de novidade, mas na verdade gostam me tudo menos de aventura. Entre liberdade e segurançazinha, escolhem sempre a segunda, por muito que digam que preferem a outra. Mais tarde, viria a ouvir isto dito de outro modo: quando lhe tiram as grilhetas, a primeira coisa que o prisioneiro faz é queixar-se do frio que tem nos pulsos."
(Rui Zink, Anibaleitor)

segunda-feira, maio 14, 2012

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"É um fenómeno curioso: o país ergue-se indignado, moureja o dia inteiro indignado, come, bebe e diverte-se indignado, mas não passa disto. Falta-lhe o romantismo cívico da agressão. Somos, socialmente, uma colectividade pacífica de revoltados." (Miguel Torga, Diário, 17-09-1961)

quinta-feira, maio 10, 2012

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"A liberdade é a única coisa que os homens não desejam, pois se a desejassem bem a alcançariam."
(La Boétie, Discurso sobre a servidão voluntária)

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"É de crer, isso sim, que [a Natureza], favorecendo alguns e desfavorecendo outros, pretendia dar lugar à fraterna afeição, dar-lhe meios de se manifestar, pois se a uns assiste o poder ajudar, os outros têm necessidade de ser ajudados."
(La Boétie, Discurso Sobre a Servidão Voluntária)

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"Revolto-me, logo existo." (Albert Camus)

quarta-feira, maio 09, 2012

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"Aprendi, pelos índios, que são em muita coisa bem melhores que nós, as pescar mesmo para os que não podem [...]" (Agostinho da Silva, Compostela - Carta Sem Prazo a Seus Amigos, Primeira de 71)

terça-feira, maio 08, 2012

Chromatics - Back From The Grave

Porn for book lovers

"Tenho a suspeita de que a espécie humana - a única – está prestes a extinguir-se e que a Biblioteca perdurará: iluminada, solitária, infinita, perfeitamente imóvel, armada de volumes preciosos, inútil, incorruptível, secreta." (Jorge Luis Borges)

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"As grandes causas são um espantoso conforto para não se olhar para dentro e para se fugir de si próprio. Isto não é fácil de dizer, mas é inteiramente assim." (Miguel Portas, em entrevista ao Expresso)

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"A dor é um animal insaciável." (Rui Nunes, Grito)

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"A infância é um país mágico donde somos todos expatriados pela percepção da morte, ou da crueldade. Uns mais do que outros, uns mais cedo que outros." (Maria Velho da Costa, Myra)