Perante o novo e diferente, temos sempre uma dupla atitude: por um lado receio e por outro fascínio. Quando somos mais doentes, predomina o receio, quando somos mais saudáveis, predomina o fascínio.
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Lidamos mal com o conflito e com a interpelação? Porque é que o outro discordar de nós é sentido pelos portugueses como uma forma de afrontamento, de intimidação? Tudo é demasiado pessoal. Confirmo isso. Se fizer uma pergunta a um conferencista, discordando dele, num congresso em Portugal, sou acusado de ser agressivo. Se for num congresso internacional, isso é completamente aceite. Aqui somos muito narcísicos, ficamos logo ofendidos. Discordar é ofender o outro.
Isso é um traço de narcisismo? É, não aceitamos bem que o outro discorde de nós, sentimos isso como uma diminuição.
Como é que ficamos menos vulneráveis, menos narcísicos? Como é que apredendemos a lidar com a crítica e aquilo que sentimos como sendo a agressividade do outro? A causa psicológica assenta num sentimento de inferioridade. Se a pessoa se sente inferior, qualquer discordância do outro é sentida como uma ofensa pessoal.
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O que nos deve entusiasmar é aquilo que não sabemos, não aquilo que sabemos. O verdadeiro cientista põe perguntas e tem poucas respostas, interessa-se por aquilo que não sabe e quer descobrir, não por aquilo que já sabe.
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Só há um processo para ultrapassar aquilo a que chamo "a angústia essencial", a angústia [que resulta da] consciência de que temos um prazo (apesar de nunca se ultrapassar totalmente, transcende-se um pouco isso): realizando alguma coisa, uma obra, transmitindo cultura.
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A evolução faz-se por fracturas. Há duas ideias sobre o progresso; há a ideia de que o progresso se faz na continuidade - acrescenta-se àquilo que já se sabe, na mesma linha. Um exemplo disso era a evolução na continuidade do Marcelo Caetano; e há outra ideia de progresso, que é por ideias fracturantes. Sou apologista desta.
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O que é que tememos tanto nessa mudança de paradigma? Se quisermos levar isto até às últimas consequências, temos medo de desaparecer, de ser engolidos? Insegurança, incapacidade de gostar do novo e do diferente. Há uma entrevista muita bonita de um professor de Física Teórica, brasileiro, um homem de 50 e tal anos. Às tantas diz: "Repare, o que é bonito não é o que é simétrico, regular. É o que tem assimetria, pequenos defeitos." Tudo é impermanente, tudo é incerto, tudo é imperfeito. É isto que nos deve atrair. As pessoas mais conservadoras querem o permanente, a certeza, o perfeito.
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Por que é que somos tão pouco persistentes? No fundo, quando nos ocupamos do curto prazo, isso quer dizer que, ou não temos a persistência ou não temos a organização necessárias. Uma das razões é porque acreditamos na Virgem. Acreditamos sempre que Nosso Senhor ou a Virgem fazem milagres, que o Estado ou os papás vão resolver a situação. Acreditamos sempre que vem qualquer coisa que nos salva, que não o nosso esforço, o nosso trabalho, a nossa intervenção. Somos educados na base da religião a sermos adaptados, a obedecer ao pai, ao chefe, ao polícia, a Deus e a não interferir no meio.
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Se este país se deitasse no divã, tinha emenda? O que é que precisaria mais que tudo, de trabalhar? Tinha de ter tempo e espaço para poder crescer por si próprio sem se apoiar noutros. A psicanálise é uma auto-análise assistida, o analista dá uns toques, o paciente é que faz a análise. Como num parto. Quem faz o parto é a mulher, a parturiente; o parteiro interfere se houver alguma coisa, se tudo correr bem, não faz nada. Facilitar o crescimento pessoal, a autodeterminação, a identificação idiomórfica, segundo o seu próprio plano, o seu próprio projecto, e não seguir ideias do analista ou de outra pessoa qualquer. Sou a favor da emigração, de que as pessoas se movam, se cruzem. E sou a falor da depressão normal, com revolta e revolução! Devemos zangar-nos com os tipos que nos fazem mal.
(António Coimbra de Matos em entrevista ao Público, de 4 de Marco de 2012: http://www.sendspace.com/file/rwgzjn)
quinta-feira, março 22, 2012
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