Porque é que os livros que citou triunfam de forma tão extraordinária?
Não tenho uma boa resposta para isso. Creio que é sobretudo um problema social. Vivemos em sociedades de consumo, que precisam de criar consumidores. O que é um consumidor? É um cidadão que não reflecte sobre aquilo que compra. Para que um cidadão não reflicta sobre aquilo que compra é necessário educá-lo na estupidez. Quer dizer, fazê-lo crer que não é inteligente, fazê-lo crer que certamente não entenderá os Diálogos de Platão, que seguramente não pode ler Dante, que com certeza não entenderá a Odisseia.
Quem é que está por detrás disso?
Se querer parecer paranoico, creio que as autoridades estatais funcionam em colaboração com as grandes empresas para manter a ideia de que o consumo arbitrário é necessário. Então, a literatura, a leitura devem ser entretenimento no sentido de serem um escape do mundo. O mesmo no que diz respeito à arte, ao cinema, ao teatro. A noção que querem inculcar-nos é a de que a criação artística e intelectual deve ser algo que nos ajude a não pensar.
[...]
No fundo, essa sua opinião - apesar das divergências que mantém com Vargas Llosa - não anda muito longe daquilo que ele escreve no livro de que já falámos, A Civilização do Espectáculo, quando se refere a um triunfo do trivial.
Sim, é o triunfo do trivial e do fácil por contraponto ao que é difícil. A ideia de dificuldade tornou-se um aspecto negativo. Durante muito tempo, a ideia de dificuldade foi algo que valorizámos porque se era difícil era porque valia a pena fazê-lo: fosse subir ao cimo de uma montanha ou estudar as obras de Espinosa ou, inclusive, nas relações humanas, estabelecer uma relação amistosa ou amorosa que requeria esforço. Os cavaleiros da Távola Redonda tinham de passar muitas provações para acederem ao amor que desejavam. Hoje, a dificuldade é vista como algo que tem de se pôr de parte e o que se promove é o que é fácil e rápido. Esta é uma propaganda consciente, feita pelas grandes empresas. Ninguém vai vender um produto dizendo: "Isto é difícil e vai requerer concentração, pense nisso, reflicta se for necessário."
(Alberto Manguel em entrevista à revista Ler, Novembro de 2012)
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