quarta-feira, novembro 16, 2011

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"[...] Muitos dizem que uma república teria de ser uma nação de anjos, porque os homens, com as suas inclinações egoístas, não são capazes de uma constituição de forma tão sublime. Mas, precisamente, por meio destas inclinações, a natureza intervém a favor da vontade geral assente na razão, mas impotente na prática. Trata-se simplesmente de organizar o Estado de tal modo (e isso não é coisa acima das forças humanas) que a acção de cada uma das inclinações egoístas, opondo-se umas às outras, acabe por moderar ou destruir os seus efeitos desastrosos. O resultado é, para a razão, o mesmo que seria se essas inclinações não existissem, e cada homem é forçado a ser bom cidadão, ainda que não moralmente bom.
O problema de organizar um Estado, por árduo que possa parecer, pode ser resolvido até mesmo no caso de um povo de demónios, contando que dotados de entendimento. O problema é: 'Dada uma multidão de seres racionais que requerem leis universais que assegurem a sua conservação, mas cada um dos quais se mostra secretamente inclinado a furtar-se a essas leis, estabelecer uma constituição tal que, embora as suas intenções privadas se combatam, se refreiem umas às outras, sendo o resultado que o seu modo de se conduzirem publicamente seja o mesmo que se não tivessem essas intenções'. Um problema como este tem de ser resolúvel; não requer que saibamos como alcançar o aperfeiçoamento moral dos homens, mas apenas que conheçamos o mecanismo da natureza, a fim de o usarmos sobre os homens, organizando o conflito das intenções hostis presentes num povo de tal modo que os seus elementos se obriguem a si mesmos a submeter-se a leis coercivas. É assim instaurado um Estado pacífico e a força das suas leis." (Kant, Perpetual Peace)

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